sexta-feira, maio 02, 2014

Depois de um ano de aprovação da PEC das Domésticas, ainda há divergências




Mais um Dia do Trabalho se passou e as empregadas domésticas aguardam decisões importantes que podem mexer no mercado. A Lei das Domésticas deve permitir ao funcionário recolher Fundo de Garantia, obter auxílio-creche e uma série de outros benefícios que empregados com carteira assinada já têm direito de usufruir. É uma conquista da categoria que, porém, pode vir acompanhada de um resultado oneroso: demissões em massa.

Um estudo de 2012, do Instituto Doméstica Legal, cita o IBGE para afirmar que houve aumento de 0,75% na informalidade no mercado de trabalho doméstico. À época, a Lei das Domésticas ainda não havia sido aprovada no Senado Federal e seus termos não haviam sido discutidos pela sociedade. Hoje, após a aprovação – ocorrida em abril do ano passado – e no aguardo pela regulamentação dos direitos, o temor de especialistas é que a reação dos patrões seja de se livrar de ainda mais empregados formais.

"A nova emenda pode ser comparada com a lei que aboliu a escravidão", afirma a professora de Direito do Trabalho da Faculdade Mackenzie do Rio de Janeiro Isabelli Gravatá. "Quando aboliram a escravatura foi tudo muito bonito, mas aumentou a mendicância. Para onde esses escravos foram? Tem que ver a consequência da legislação. Que mercado pode absorver essa expressiva mão de obra?", questiona a acadêmica.

Isabelli aponta ainda que muitos dos trabalhadores não têm qualquer qualificação, portanto teriam dificuldades de se readaptar ao mercado. "A empregada doméstica não trabalha para um negócio que visa gerar lucro. A gente paga o trabalho dos domésticos com nosso salário. Então, aumentar o valor do empregado sem aumentar nosso salário, vai gerar desemprego para eles", resume.
Kléber Lima
FGTS é principal dúvida
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Domésticos do Distrito Federal, Antônio Ferreira Barros, no entanto, pensa diferente. Para ele, a aprovação da legislação da maneira como está será benéfica à categoria. "São desses direitos que precisamos. Não tememos que os empregados sejam demitidos, pois o custo adicional para os patrões será muito pouco", afirma.


Segundo Barros, o sindicato da categoria recebe uma média de dez ligações diárias de trabalhadores em dúvidas quanto a seus direitos e deveres. Ele diz que o principal ponto para a categoria será a obrigação de pagar Fundo de Garantia aos empregados e ter uma multa alta em caso de demissão. "Não achamos justo uma empregada trabalhar às vezes 20 anos na casa e ser demitida de repente, sem benefícios", defende Antônio Ferreira Barros.

Esperança de ter tranquilidade
A empregada Rosilene da Silva, de 27 anos, trabalha há cinco meses em uma casa no Riacho Fundo. Ela já teve carteira assinada, mas hoje em dia aguarda sua patroa começar a anotar a sua. "Já tive problemas no passado com patrões que não pagaram. Uma viajou, não me pagou e aí tive de sair do serviço", relata.

Ela diz que trabalhar com carteira assinada é a segurança necessária para ficar tranquila. "Tem que pensar mais para frente, na aposentadoria", completa. Rosilene não tem filhos ou família para cuidar, por isso afirma ser melhor dormir no local de trabalho.

O que já vale
Até o momento, apenas dois itens da Lei das Domésticas estão em vigor: a delimitação de carga horária de 44 horas semanais e o pagamento de horas extras. "O que mais traz expectativa é a aprovação da obrigatoriedade do FGTS", revela o presidente do sindicato da categoria, Antônio Ferreira Barros. Ele acredita na aprovação da lei ainda este ano. "Essa espera é comum. Existem outras questões que nunca foram regulamentadas", argumenta.


Para tentar equilibrar a situação, o Instituto Doméstica Legal fez um abaixo assinado. A ideia era criar descontos para o INSS do empregador que regularizar ou contratar o empregado em situação regular.
Isso motivou o Projeto de Lei Complementar 302/2013. Segundo o estudo Retrato do Emprego Doméstico, do instituto, o PLC "já reduziu o INSS de direito do trabalhador de 12% para 8%, mas não é suficiente para estimular a formalidade". A meta é a redução para 4%, que deve apaziguar a situação do contratante.

Quem faz boas previsões
A luta por direitos básicos como 13º salário, pagamento de horas extras e FGTS virou um sonho de várias empregadas domésticas. Empolgadas, elas aguardam o tão merecido reconhecimento da classe. Maria do Amparo Borges, de 53 anos, trabalha há 35 anos em residências. Alguns, bem sofridos.


Amparo chegou a Brasília em 1980, época em que os direitos das domésticas estavam longe de ser reconhecidos. Ela passou maus bocados em várias casas para sustentar suas filhas.

"Eu não tinha onde morar, então trabalhava e dormia nas casas. O problema é que, quando você dorme, trabalha o triplo. Você tem que fazer o jantar, lavar a louça, aí depois acorda já para fazer o café da manhã. E não ganhávamos a mais por isso, sabe?", lamenta.

O que era lamento, no entanto, virou motivo de comemoração. Amparo está feliz com os rumos de sua profissão. "É uma benção. A classe será reconhecida e poderá usufruir de 13º salário, horas extras e FGTS", comemora.

Há 16 anos, ela trabalha como sempre quis: com dignidade e carteira assinada. E assim vai continuar. "No meu emprego ganhei uma família. E sei que vou continuar aqui, com todos e mais direitos", alegra-se. Sua patroa, a médica Rejane Breckenfeld defende direitos iguais aos trabalhadores. "O trabalho dentro de casa é um dos mais difíceis. Faço questão de pagar por todos os direitos", frisa.

O outro lado da moeda
Apesar de a PEC das Domésticas ampliar os direitos dessa classe de trabalhadores, há quem reclame da escassez de emprego causada. O reflexo está no crescimento do trabalho das conhecidas diaristas, faxineiras que vão duas ou apenas uma vez por semana trabalhar nas casas para conseguir o suado dinheiro do mês.


Esse é o caso de Maria Ana Rodrigues, de 57 anos. A doméstica já trabalha há 30 anos em casas como faxineira. Ela relata que a realidade da classe mudou muito, já que hoje em dia é difícil conseguir se fixar em uma única residência.

"Antes a gente ainda ficava um tempo nas casas. Hoje, eu tenho dois empregos diferentes como diarista para conseguir me manter. Os patrões que tinham preguiça de arrumar a casa preferem atualmente se virar a gastar a mais", acredita.

A diarista quer ter um emprego fixo para poder usufruir de todos os direitos. No entanto, acha difícil que essa realidade se concretize. "Além de pesar no bolso, as pessoas só fixam contrato quando são íntimas, já se conhecem bem. Começar do zero e com essas novas exigências acaba espantando os patrões".

Praticidade
Dentista e cirurgião clínico, Júlio César Barcellos foi um dos que optou por contratar uma diarista. Além de morar sozinho, ele acha a opção mais prática, principalmente por não pesar no orçamento. "Para quem mora sozinho é mais fácil contratar por diárias. Sai muito mais em conta, ainda mais com as novas regras. Mas acho justo que todos os trabalhadores tenham os mesmos direitos. É óbvio", frisa.

Fonte: Da redação do Jornal de Brasília

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